Com a escolha do Rio de Janeiro como sede dos jogos olímpicos de 2016 e a Baía de Guanabara como palco para as competições aquáticas, como a canoagem e vela, suas águas foram postas novamente em evidência. Mais do que as águas da Guanabara, o que tem chamado a atenção e preocupado as autoridades e atletas são as toneladas de lixo e esgoto acumulados ao longo de séculos e que chegaram a colocar em xeque a realização das competições aquáticas no local, devido ao risco de acidentes e a saúde dos competidores.
Os rios que desaguam na Baía da Guanabara nascem na Serra do Mar, percorrem caminhos escarpados por montanhas de até 2.000 metros de altitude, passando por planícies, ambientes urbanizados e manguezais, constituindo o ambiente costeiro que ocupa uma área de aproximadamente 400 km².
No seu entorno, desenvolveu-se a Região Metropolitana do Rio de Janeiro, o segundo maior parque industrial do país.
Com a definição do Rio como sede dos jogos olímpicos, o governo estadual assumiu, junto ao Comitê Olímpico Internacional (COI), o compromisso de coletar e tratar 80% do esgoto da região metropolitana. Mas esse é um problema que se arrasta há décadas.
44 anos em 20
Há 24 anos, durante a Eco-92, o Programa de Despoluição da Baía de Guanabara foi anunciado. Iniciado em 1995, ele foi prorrogado oficialmente sete vezes e continua inacabado. Hoje, apenas um terço de todo o esgoto gerado nos quinze municípios do entorno da Baía é tratado, e apesar da promessa de despoluição, ela continua a receber 10 mil litros por segundo de esgoto não tratado.
Desde a assinatura com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para o início do projeto de despoluição, o Rio de Janeiro passou por seis governos sem que o projeto de despoluição avançasse minimamente. Estima-se que cerca de 1 bilhão de dólares financiados pelo BID e governo japonês já foram gastos sob o bojo do projeto de despoluição até o momento, e segundo especialistas, estima-se que muito mais deverá ser investido num período de pelo menos mais 20 anos para alcançar minimamente as metas de despoluição.
Opiniões diversas
Para Carlos Portinho, principal autoridade ambiental do Rio de Janeiro, as críticas relacionadas a qualidade da água da Baía de Guanabara são superlativadas. Segundo ele, testes recentes demonstraram que a contaminação fecal na área da regata Olímpica estava dentro dos padrões “satisfatórios” no Brasil.
O secretário de Ambiente do Rio de Janeiro, André Corrêa, chegou a mergulhar nas águas da Guanabara para “provar que as competições de vela das Olimpíadas de 2016 podem acontecer no local”.
Já o multimedalhista nas competições de vela, Lars Grael, deu declarações a imprensa afirmando que as competições seriam “competições com obstáculo” devido ao acúmulo de lixo nas águas.
Nas vésperas dos jogos, barcos percorrem a Baía da Guanabara dia e noite recolhendo toneladas de lixo flutuante: geladeiras, sofás, pneus, fogões, garrafas plásticas, lixo doméstico… dezessete eco-barreiras foram instaladas nas imediações das competições para tentar conter o lixo.
Depois de décadas, um projeto que tinha como objetivo despoluir a Baía da Guanabara, ambiente cercado por mais de 10 milhões de habitantes, dezenas de municípios, com mangues, flora, fauna marinha, continua em situação de risco.
Não se trata apenas das imagens que as emissoras de TV, atletas e turistas do mundo inteiro captarão de nosso país. Se trata de vidas, do presente e futuro do Brasil e das águas que não abrigam somente vida marinha, mas sustentam famílias.
Exemplo a ser seguido
Alguns exemplos podem apontar o caminho para a despoluição da Guanabara. Um deles é o da Baía de Homebush, em Sidney, que já foi considerada um dos locais mais poluídos da Austrália. O projeto que envolveu reflorestamento, descontaminação do solo, tratamento de dejetos industriais e de esgoto doméstico, contenção de vazamentos e a construção de novos aterros sanitários tem dado certo. O esforço conjunto do governo australiano, iniciativa privada, organizações de defesa do meio ambiente e sociedade civil mobilizados garantiram não apenas a realização das provas aquáticas nos jogos olímpicos de 2000 – sediados naquele país – mas também um importante legado para a sociedade. Ainda assim, atividades como a pesca ainda são proibidas naquelas águas devido aos altos índices de dioxina (substância cancerígena), triste herança do despejo dessa substância pela indústria química na Baía de Homebush.